domingo, abril 30, 2006



Dos chatos
(também por Mário Quintana)

"O maior chato é o chato perguntativo. Prefiro o chato discursivo ou narrativo, que se pode ouvir pensando noutra coisa... Me lembro que fiz um soneto inteiro — bem certinho, bem clássico e tudo — durante o assalto ao Quarto do Sétimo, isto é, quando um veterano de 30 me contava mais uma vez a sua participação nas glórias e perigos daquela investida.

As velhotas que nos contam seus achaques também são de grande inspiração poética.

Mas que fazer contra a amabilidade agressiva do chato solícito? Aquele que insiste em pagar nossa passagem, nosso cafezinho, ou quer levar-nos à força para um drinque, ou faz questão fechada de nos emprestar um livro que não temos a mínima vontade de abrir...

Ah! ia-me esquecendo dos proselitistas de todas as religiões. Os proselitistas amadores, que são os piores. Quanto aos sacerdotes que conheço, registre-se em seu louvor que eles sempre me falam de outras coisas. Ou me julgam um caso perdido ou um caso garantido... Bem, qualquer que seja o caso, deixam-me em paz.

O que pode acontecer de mais chato no mundo é o chato que se chateia a si mesmo, o autochato.

Para essa extrema contingência, descobri em tempo que a última solução não é o suicídio. É escrever, desabafar para cima do leitor, o qual, se me leu até aqui, a culpa é toda dele.

Há gente para tudo..."

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Incitando a auto-reflexão.
Como cantaria Oswaldo Montenegro, dono
dos discos mais chatos da história
da MPB, "Eu sou um chato, meu Deus
não me aguento. Só me tacando no mar"


Foto capturada em http://www.yellowcakewalk.net/images/Sept3_2005/brota_com_bush_pentelho.jpg

Acordando os mortos



A Carta
Por Mário Quintana

"Hoje encontrei dentro de um livro uma velha carta amarelecida,
Rasguei-a sem procurar ao menos saber de quem seria...
Eu tenho um medo
Horrível
A essas marés montantes do passado,
Com suas quilhas afundadas, com
Meus sucessivos cadáveres amarrados aos mastros e gáveas...
Ai de mim,
Ai de ti, ó velho mar profundo,
Eu venho sempre à tona de todos os naufrágios!
"


A Carta
Por Stela Guimarães

Aos 91 anos, ela colecionava cartas e pedaços de papel que eram a sua própria existência. Diferentemente da história usual, quando se colecionam cartas escritas pro outrem, ela guardava cuidadosamente as cartas escritas por ela própria e nunca entregues.

Eram cartas de amor, sempre direcionadas ao mesmo endereço, embora Ele nem vivesse mais lá ou neste mundo, à cartas de reclamação recentemente escritas à organismos de defesa ao consumdidor.

Sua vida estava lá, toda contada a pessoas que ela esperava encontra no Paraíso. Há muito tempo ficara sabendo que as cartas para o bem amado eram escritas em vão. Ele havia morrido em um trágico acidente envolvendo a escada de uma igreja e sua cadeira de rodas.

Mesmo sabendo da morte, ela continuava escrevendo incessantemente. Sentia-se assim em contato com aquele com quem vivera os melhores seis dias de sua vida, em um verão muito, muito distante dos dias idos.

E assim ela ia seguindo, escrevendo enquanto o ar entrasse em seus pulmões. E assim ele estaria lá, sempre.


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PS.: Justificativa brega e decadente: Porque toda Rose tem um Jack perdido em algum oceano por aí.
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Pergunta que quer calar:

Vale a pena acordar nossos mortos?
Ou continuar a nossa vida desviando
atenção a cada ocorrência de tal
pensamento?

That´s all, folks!

terça-feira, abril 25, 2006

Ordinary Life is Pretty Complex Stuff*



Nem Super Man, Batman, Robin ou Lanterna Verde. O herói ou melhor, o anti-herói, como sugere o título em português, dessa história atende pelo nome de Harvey Pekar, cuja vida inspirou o filme American Splendor, ou o Anti-Herói Americano, no Brasil, lançado em 2003 pela HBO Films.

Elevado ao posto de celebridade graças ao relato de sua vida supostamente sem graça no gibi de mesmo título do filme, o arquivista aposentado de um hospital de Cleveland foi ‘descoberto’ em meados da década de 70 pelo amigo Robert Crumb, famoso desenhista e criador do personagem “Fritz, The Cat” responsável pelas primeiras ilustrações do arquivista que apesar de criativo não dispunha de talento artístico “traçar uma única linha reta”, segundo ele próprio.

Desde o seu lançamento, o gibi American Splendor recheado do azedume de Pekar diante da vida foi aclamado pela crítica americana e suas edições chegavam a esgotar nas prateleiras das lojas.

O sucesso residia justamente em demonstrar o fracasso de sua vida sem maior pretensão além de imprimir a marca peculiar de seu humor azedo e desencanto em relação ao sistema político e à própria existência por meio de um retrato ‘em preto e branco’ do seu cotidiano de ‘pessoa comum’.




Dono de um romantização às avessas, a história de Harvey é a do próprio com a do personagem ilustrado nos seus gibis. É parte da indústria cultural e sabe ter sido explorada por ela –principalmente pelas mãos de David Letterman, com quem dividiu as atenções, na pele de entrevistado (pago pela emissora NBC) do famoso talk show Night Life.

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Depois de escrever achei essa crítica muito mais aprofundada
Dessa forma, transformado em ícone do anti-herói, nunca deixou o emprego de funcionário público mesmo quando, depois de nove edições de seus gibis, começou enfim lucrar com o trabalho literário.

A produção –e é claro, as idéias azedas do criador de American Splendor—, estão presentes no filme que mescla o tom documental e ficcional/dramático, com direito a quadrinhos animados e a participação ativa de Pekar, responsável pela narração de si mesmo, vivido na ficção pelo competente ator Paul Giamatti (de Sideways, entre outras).

A exemplo de seu protagonista, o filme acabou à margem do circuito comercial dos cinemas, embora esteja disponível nas locadoras. Já os livros e gibis ainda não estão disponíveis no Brasil (se alguém achar, avise-me, por favor). Nos Estados Unidos, a antologia de American Splendor pode ser encontrada por U$ 18,75 no site oficial do autor, http://www.harveypekar.com.

“Before we get started with any of this you might as well know I had vasectomy”

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PRA QUEM GOSTOU, RECOMENDO A CRÍTICA DO CINEMA EM CENA,
relacionada abaixo.

Anti-Herói Americano - American Splendor, 2003

Dirigido por Shari Springer Berman e Robert Pulcini. Com: Paul Giamatti, Hope Davis, James Urbaniak, Earl Billings, Harvey Pekar, Judah Friedlander, Toby Radloff, Donal Logue, Molly Shannon e Daniel Tay.

'Por que todo mundo tem que ser tão idiota?', pergunta o jovem Harvey Pekar logo no início de Anti-Herói Americano, estabelecendo, de imediato, a mal-humorada visão de mundo que o acompanhará por toda a vida e que irá inspirá-lo a roteirizar Esplendor Americano, uma série de revistas em quadrinhos que se tornou sucesso entre o público underground e que deu origem a este filme.

Escrito pelo casal Shari Springer Berman e Robert Pulcini (que também divide a direção), Anti-Herói Americano é um fascinante estudo de personagens que não se preocupa em narrar uma história com trama bem definida e que tenha começo, meio e fim. Não, nada disso: aqui, a única reviravolta que acontece é a própria passagem do tempo e sua ação sobre os protagonistas: um bando de indivíduos cínicos e desesperançados cujo desprezo pelas demais pessoas só perde, em intensidade, pelo desprezo que sentem por si mesmos. Não é à toa que, ao olhar para o próprio reflexo em um espelho, Pekar constata: 'Esta (sua aparência) é uma decepção com a qual eu sempre posso contar'.

Incapaz de traçar sequer uma linha reta, Harvey Pekar (o verdadeiro) entregava seus roteiros para que diversos desenhistas os ilustrassem - e, como conseqüência, cada edição de Esplendor Americano trazia uma diferente versão do protagonista (o próprio autor), que poderia variar entre 'um jovem Brando e um macaco peludo'. Pois uma das grandes virtudes desta releitura para o Cinema deve-se justamente à fidelidade do roteiro a esta constante mutação do (anti) herói: apesar de ser interpretado por Paul Giamatti, é Pekar quem narra o filme, chegando a comentar a diferença: 'Aí estou eu... ou melhor, o cara que está me interpretando e que não se parece nada comigo'. Aliás, o longa vai além, e chega até mesmo a exibir cenas de 'bastidores' que trazem os atores ao lado dos 'personagens' que representam.

Mas não é só isso: além de contracenar com o verdadeiro Pekar, Paul Giamatti também divide algumas cenas com a versão em quadrinhos do mesmo - e, em certo momento, assiste a um espetáculo teatral no qual o sujeito é vivido por outro ator, Donal Logue. Com isso, Anti-Herói Americano se transforma em um filme auto-referencial e com várias camadas de realidade e ficção, que se entrecruzam de maneira inteligente e dinâmica (há uma cena na qual a atriz Hope Davis, que vive a esposa do protagonista, assiste a uma entrevista concedida por este a David Letterman - e como uma imagem de arquivo é utilizada pelos diretores, cria-se a inusitada circunstância em que a versão fictícia da esposa ultrapassa o limite entre a fantasia e a realidade e consegue enxergar o verdadeiro Harvey Pekar).

No entanto, em vez de comprometer a experiência do espectador ao 'retirá-lo' do filme, quebrando a ilusão do Cinema, o filme acaba se beneficiando com o recurso, que confere ainda mais dimensão aos personagens e transforma o longa em uma combinação fluida de documentário e ficção (ao contrário do recente 1,99 - Um Supermercado que Vende Palavras, que escapa de ambos os gêneros). Além disso, a estupenda performance de Giamatti intensifica ainda mais este efeito, já que suas expressões corporal (sempre encurvado e desconfortável) e facial (o cenho constantemente franzido e o olhar que jamais encara o interlocutor) convertem o Pekar da ficção em uma visão extremamente fiel do original. E a boa notícia é que o mesmo pode ser dito sobre as atuações dos demais integrantes do elenco - em especial Hope Davis e Judah Friedlander, que encarna o auto-proclamado nerd Toby Radloff.

Não será surpresa alguma, a indicação de Anti-Herói Americano a vários prêmios de relevo - especialmente nas categorias Filme, Direção, Roteiro Adaptado, Ator, Edição e Direção de Arte. Aliás, o único 'defeito'grave que encontrei na produção diz respeito à tradução de seu título para o português: 'anti-herói americano' pode até ser uma definição interessante do papel de Harvey Pekar, mas é romântica demais. Particularmente, creio que a melhor escolha teria sido a tradução literal, Esplendor Americano, cuja ironia certamente não passará despercebida por quem já tiver assistido ao filme.

Seja como for, Pekar deve ter ficado satisfeito com o resultado final. Ele pode até não saber se ainda é uma pessoa real ou se já se tornou um personagem (preocupação que manifesta em certo instante), mas isso não importa: ambos são fascinantes.


19 de Outubro de 2003

quinta-feira, abril 06, 2006

Qual é o nosso tamanho?




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Conceito artístico descreve um tipo de estrela morta
chamada pulsar e o disco de poeira estelar que a envolve


Um conceito artístico não datado mostra um tipo de estrela já morta chamada pulsar circundada por um disco de poeira estelar. A estrela foi descoberta pelo telescópio espacial da NASA Spitzer.
A pulsar, chamada 4U 0142+61, foi um dia uma grande estrela até que, há cerca de 100.000 anos, despedaçou-se numa explosão supernova e espalhou escombros e poeira no espaço. Alguns dos escombros foram capturados no que os astrônomos chamam de "disco de retirada", que agora circunda o que sobrou do núcleo estelar, ou pulsar.
O disco assemelha-se a discos protoplanetários de estrelas jovens, onde se crê que planetas nasçam.


REUTERS/NASA/JPL-Caltech/Handout
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Astronomia é um assunto fascinante. Quando criança, um dos meus sonhos era ter um telescópio gigantesco pra observar as estrelas e os planetas. Sofri quando vi a passagem do cometa Harley apenas a olho nu, pela total falta de incentivo (e grana, principalmente) dos meus pais.

Aos 16, li pela primeira vez “Uma Breve História do Tempo”, do físico Stephen Hawking.
Passado os anos e hoje provedora do meu sustento ainda não comprei o tal telescópio. As estrelas continuam lá e as respostas ainda não vieram. Até mesmo Hawking reviu suas teorias em um livro que ainda não li.

Todo mundo sonha em ir ao espaço mesmo que ele nos dê a dimensão da nossa pequeneza.

E você. De que tamanho é?


Obs. Obrigada André (e Elton) pela cobrança do meu retorno por aqui ;-)