Pintadas a mão por Stela, pessoa estranha porém bem-humorada e insistente na tentativa de imprimir cores em seu mundinho cotidiano mas raramente monocromático.
sexta-feira, fevereiro 29, 2008
Can´t take my eyes
E um dia você vai se pegar ouvindo "Can´t take my eyes of you" com o Barry White e achar lindo. Tanto faz se é música de baile, de fim ou começo de carreira. Alguma coisa mudou em você que fez a composição fazer todo sentido mesmo que sua predileção musical não se aproxime do repertório de bailes de terceira idade.
Pluft: automaticamente algo ligaria dentro de você. De súbito, começaria a se lembrar de alguém para quem a música deveria ter sido escrita, como se a composição pudesse ter saído da sua letra, da pressão dos seus dedos sobre do teclado ou da máquina de escrever (claro, se essa conclusão tivesse ocorrido até os anos 80) diretamente para as rádios de décadas atrás.
E um dia, não importa quando, você vai achar que sua vida teria mais sentido se você tivesse alguém pra cantar essa música.
E você pensará: uau, talvez conheça alguém assim! Alguém certamente mais brilhante que a musa inspiradora de Frankie Valli, o compositor da tal música.
E neste momento você deduzirá que sua vida não faria sentido se você não se sentisse exatamente como descreve a letra. Pouco importa se é 'kitsch', brega ou algum adjetivo mais pejorativo que os atribuídos às composições de Wando, o rei da calcinha no palco.
E essa conclusão o faria voltar a ouvir alguma das mais variadas gravações de "Can´t my eyes..." (embora saiba que não se trata de nada além de auto-flagelação).
E nesse dia você saberá que sentimento como esse quando surge é assim mesmo: uma coleção de clichês, de frases feitas e, em muitos casos, de corações solitários ou sofredores.
E por conta disso, você suspirará de forma intermitente pensando que seria tão legal se pudesse cantar "Can´t take my eyes..." como Andy Williams.
E nesse segundo, que pode durar uma eternidade, a única certeza que lhe restaria é:
"I love you, baby,
And if it's quite alright,
I need you, baby,
To warm a lonely night.
I love you, baby.
Trust in me when I say:
Oh, pretty baby,
Don't bring me down, I pray.
Oh, pretty baby, now that I found you, stay
And let me love you, baby.
Let me love you."
domingo, fevereiro 17, 2008
Onde se encontra a (des)igualdade
Não são nos abraços dos amigos e nem nas multidões das festas que eu me sinto igual ao outro. Meu contato com a realidade --que insistimos em fugir-- é nos ponto de ônibus. Naqueles minutos que passo em meio à massa da qual faço parte, com quem divido os lugares em ônibus tantas vezes cheios e onde minha expressão facial não me diferencia de ninguém: como a de outros, é a de cansaço após a jornada de tantas horas de trabalho.
A freqüência neste espaço tem reduzido na minha vida graças a comodidade ou preguiça, talvez, que a invenção de Henri Ford nos deu (e à atmosfera contribuo com o monóxido de carbono enquanto critico Bush pela ausência no Protocolo de Kyoto).
Mendigos, subempregados e pouquíssimos bem remunerados dão cor à plataformas das coberturas vermelhas dos pontos desta cidade. Atenta, vou colecionando histórias que ouço como se fossem um pouco minhas. A última delas veio de uma diarista na semana passada.
Enquanto escondíamo-nos da chuva que insiste em cair após às 17h, ela contava para uma 'amiga' cozinheira como mantém a boa forma (de fato, capaz de causar inveja às peruas das academias e dos botox):
-- Eu ando muito, mais de uma hora direto, dona Jacira. Vou até o serviço à pé porque com saúde a gente não brinca. Ainda mais agora que o Valtencir foi embora com aquela outra. Quero ficar bem bonita pra quando ele voltar. Porque ele volta, isso eu sei.
Fiquei imaginando a rotina dessa mulher que certamente abastece sua caminhada com a lembrança do bem-amado. E filosofo comigo mesma: "o amor é igual entre todos. Entra na nossa cabeça feito piolho insistente em cabelo de criança", penso eu. "Não importa quem povoe a sua: andamos todos por aí com um monte de gente pendurada em nós".
O pensamento poético só é interrompido pela presença de um andarilho que circulava em volta do pseudocoreto, sorridente em seu universo paralelo.
Logo percebo que não se trata do andarilho clássico: faltava-lhe a garrafa de pinga e algo mais, que costumamos atribuir no senso comum da indiferença a essas pessoas. Provavelmente ele sofra de alguma deficiência neurológica, concluo enquanto questiono-me: "Por que não foi amparado? Se foi, porque deixou de ser? O que gente como eu pode fazer por essas pessoas, além de lhes dar um saco com uvas insuficientes para matar a fome de um dia (como eu fiz)?".
Sobra-me uma ressaca moral e uma sensação de insuficiência --menos pela demora no coletivo e mais pelo soco de realidade no estômago mal (ou bem) acostumado. Pois neste lugar aqueles que se sentem diferentes realmente encontram seus iguais.
quinta-feira, fevereiro 14, 2008
O Ministério da Saúde Adverte...
Talvez o André devesse trazer acoplado um rótulo com a mensagem no estilo: “o Ministério da Saúde Adverte...”
Tanta doçura encerrada em uma única pessoa poderia causar uma espécie de diabetes do bem ou um incremento calórico mais viciante que chocolate para mulheres com TPM.
Não raro, sua presença pode causar rompantes de taquicardia, proporcionalmente inversa à distância. Sua ausência tem efeito semelhante –cria uma ansiedade imensurável do próximo encontro –apaziguada pela certeza de que eles são sempre felizes e coloridos sem artificialidade.
Ele também pode provocar irregularidades nos sistemas neurológico e gastrointestinal, quando não consegue, às vésperas, decidir qual o meio de transporte da sua viagem.
Mas todos as reações adversas são compensadas. Porque do seu lado você sente uma sensação de plenitude abastecida principalmente por uma alegria boba que remete aos primeiros anos de infância.
O efeito à corrente sanguínea é incontestável –é como se desobstruíssem suas artérias e seu coração fosse irrigado não apenas por sangue, mas por uma mistura do líquido com felicidade diluída. Naturalmente, a visão parece ganhar novos tons e passar de um estágio monocromático para belas mistruras de ciano, yellow e magenta. E perto dele não há momento de escuridão, porque André não é estrela -é pura luz.
Se sentir frio, não é lugar melhor para se estar que perto dele. Seu abraço é como cobertor quentinho para desabrigados no inverno e sua risada tão espontânea provoca um efeito cascata: e se pudéssemos envasá-la, penso que seria um ótimo remédio para maníacos-depressivos.
Por essas e outras, certamente o Ministério da Saúde adverteria que, na balança, vale mais a pena sofrer possíveis efeitos colaterais a esquecê-lo.
sábado, fevereiro 09, 2008
Será tudo culpa do rock n´roll?
Minha irmã argumenta que eu não me visto de acordo com a 'minha idade'. Influenciada por programas como 'Esquadrão da Moda', ela sonha em me ver vestida com discrição, em cima de saltos altos sem cores berrantes e, quem sabe, com os cabelos devidamente bem cortados.
Meu (ex)chefe endossa o coro em prol da 'moral e bom costume': parou-me outro dia no corredor para me dizer que minha calça cor-de-rosa choque definitivamente não combinava com meu All Star vermelho. Tudo bem, porque ele costuma dizer coisas sem sentido e a usar majoritariamente calça jeans e camisa de tricoline branca, delineada com perfeição pela barriguinha que Deus e a cerveja lhe garantiram.
Nunca fui trabalhar de roupas curtas e no máximo com um decote que pelos meus dotes físicos não chamam a atenção de ninguém (mesmo com o bojo).
Eu tenho roupas muito coloridas e só troco meus All Star´s pela coleção de sapatilhas. Os saltos altos são bem vindos, especialmente se forem de plástico.
Nasci em 77 e sequer completei 31 anos, por isso acho que estou no direito de me colorir à vontade. Os cabelos excessivamente vermelhos eu já deixei no passado e não sinto saudades dele nem quando olho pra MariMoon. Não pretendo fazer mais nenhuma tatuagem. Tudo dentro da normalidade, certo? Só não abandono o rock n´roll, independentemente da idade que venha a ter. Pra mim, é ele que abastece meus dias quentes e frios, faz-me saculejar como uma adolescente, estabelece afinidades, compõe e me recompõe. Sua atitude embala-me mesmo em meio às marchinhas de carnaval. Music is my hot sex, my certain romance.
E se há uma fonte da juventude real, o nome dela é rock n´roll. O resto é nota musical.
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