Líder neofascista ucraniano.
No início dos anos de 1990, circulou no centro da
minha cidade natal, no interior de São Paulo, um abaixo-assinado de apoio aos
movimentos separatistas da Iugoslávia. Não me lembro ao certo porque me
interessei pelo tema (eu tinha 12 anos de idade), mas lembro-me de ter ouvido
atentamente as instruções dos coletores a respeito da importância do apoio dos
brasileiros para a emancipação da Eslovênia, Croácia e Bósnia.
Lembro-me de achar legítima a reivindicação e,
embora eu possivelmente estivesse mais preocupada em colecionar fotos da boy
band do momento, parecia-me justo defender a autonomia dos países e a
democracia. Aqui, havia acompanhado a celebração de minha família nos Diretas Já
(mesmo sem entender ao certo o que isso representava), mas o voto direto era um
conceito debatido com certa frequência pelos meus tios militantes partidários
quando eu mal tinha saído das fraldas. Talvez por isso, a reivindicação dos
defensores dos Bálcãs pareceu-me automaticamente justa, embora tão, tão
distante de nós aqui no Brasil.
Passados pouco mais de vinte anos, a Ucrânia, país próximo
aos Bálcãs, não me parece tão distante quanto a antiga Iugoslávia no passado. E
não é a internet a responsável pela redução dessa proximidade entre nós e os
ucranianos.
A despeito do sofrimento humano em qualquer guerra civil, o que me faz compadecer dos conflitos instaurados naquela nação
recentemente é o receio de estarmos muito mais próximos dos ucranianos
do que poderíamos pressupor. Pode parecer pessimismo – e é, admito – mas alguns
pontos da sociedade brasileira são condizentes com o cenário da Ucrânia
pré-conflito.
No artigo “Dossiê
Ucrânia: os neonazistas a um passo do poder”, publicado
originalmente na Agência
Rebelión, o jornalista ucraniano Oleg Yasinsky expõe como as coisas foram ficando fora de controle
no país tido como um dos mais pacíficos da região.
Em crise financeira, alguns protestos começaram a
ser deflagrados em ambos países. Guardadas as diferenças entre os dois governos
– Brasil e Ucrânia têm líderes muito diferentes – nos dois países os protestos sobre
reivindicações de forma legítima, por melhores condições, mas acabaram
abarcados por grupos de interesses ainda escusos no Brasil.
O que é nebuloso no país da
Copa, não leva máscara na Ucrânia. Por lá, os protestos contra o governo de
direita são encabeçados por grupos de ultradireita extremamente mais violentos,
segundo Oleg Yasinsky.“Lamentavelmente,
essa ultradireita tem agora cada vez mais aceitação social. Isso acontece
porque a ultra-direita age contra um governo corrupto, que praticamente perdeu
sua legitimidade frente à maioria dos ucranianos, enquanto uma outra direita,
agora uma terceira, a da oposição democrática, a dos contos europeus e prantos
por Yulia Timoshenko [líder da oposição ucraniana], não teve mérito e
capacidade para encabeçar os protestos populares”, disse o jornalista em seu
texto.
Por lá, as coisas ficaram fora
de controle – e é esse ponto o mais preocupante. Lembro-me que, em junho do ano
passado, a gritaria contrária às bandeiras e partidos políticos nas
manifestações “dos vinte centavos”. Um tanto perdido, o governo do Brasil agora
estuda restringir oficialmente protestos e proibir uso de máscaras. Em São
Paulo, não é segredo algum a truculência da PM nas manifestações também cada
vez mais violências e nas quais estão presente os “Black Blocs”, nascidos como
anarquistas, mas donos de um discurso cada vez mais reacionário.
Outro jornalista ucraniano, Aleksandr Karpets, no artigo de
título sugestivo “Quando a ‘Revolução’ muda de
rumos”, nos dá pista da semelhança entre os dois movimentos: “Antes de 19 de janeiro deste ano, os
protestos se limitavam a declarações exaltadas, promessas, ameaças, festa e
cantos na Praça da Independência de Kiev, que hoje é midiaticamente conhecida
como Euro-Maidan (“maidan” é praça em ucraniano). Os “líderes” estavam
preocupados com seus futuros ganhos eleitorais. Dava a impressão de que eles
tinham medo de tomar decisões e depois ter que arcar com elas. A massa repetia
o refrão delirante de uma “revolução apolítica”.”, relata o jornalista.
Neste contexto, os grupos dos sem bandeiras, mas não sem
ideologia, - os neonazistas- foram ganhando força. Na Ucrânia, como no Brasil, foi prometida
formas não-violentas de protesto como uma “greve geral”. “Ela foi prometida em reiteradas oportunidades, mas nunca se
concretizou, por conta da mesma incapacidade organizativa e ideológica dos
“líderes” “pró-europeus”, escreveu Aleksandr Karpets.
Nesse domingo (23 de fevereiro), as redes sociais
reportavam um incidente em São Paulo, quando um
motorista avançou sobre um bloco de Carnaval na Vila Madalena,
atropelando 20 pessoas. Não bastasse a barbárie do episódio, foliões
enfurecidos teriam dado resposta à mesma altura, depredando o carro
supostamente blindado do agressor e – pasmem – partindo para uma tentativa de
estupro da namorada do atropelador.
E este não foi o primeiro caso de “justiça com as
próprias mãos”. Nos últimos dez dias, uma onda de pseudojusticeiros espancaram
e amarraram suspeitos de crime (até ser julgado pela Justiça formal não posso
chama-los de bandidos) em Mato Grosso, Santa Catarina, Piauí (amarrado a
formigueiro), Natal, Rio de Janeiro e no Paraná.
Parece que a lógica olho por olho, dente por dente,
começa a ficar legitimada na classe média brasileira. Que qualquer semelhança
entre a situação entre Ucrânia e Brasil seja mera coincidência.
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Recomendo a leitura de http://revistaforum.com.br/blog/2014/02/dossie-ucrania-os-neonazistas-a-um-passo-do-poder/