quinta-feira, fevereiro 23, 2012

Sobre jabuticabeiras e quintais



Tem coisas que a gente só é capaz de aprender quando é criança. Comer jabuticabas é uma delas. Tente ensinar um adulto a comer jaboticabas e bingo: terás a comprovação da impossibilidade do aprendizado tardio de tal atividade. Sempre haverá uma cara enojada da cor branquinha que sai do fruto – ainda que haja alguma semelhança com as uvas, estas mais populares que a prima jabuticaba – ou outro preocupado com os efeitos colaterais. “Dá prisão de ventre”, disseram-me uma vez.

Sorte tive eu, que aprendi pequenininha a comer o fruto redondinho direto do pé, ainda no jardim de infância. Era um tempo em que as escolinhas tinham árvores, sem que isso impactasse nas mensalidades ou aparecesse como um bônus nas propagandas. As escolas tinham árvores porque isso era comum também nas casas de amplos quintais, coisa rara hoje nas grandes cidades.

Naquela época, a gente ficava ansioso pela época de colheita da fruta. Dia a dia, acompanhávamos o crescimento da bolinha verde, que ia mudando de cor com o tempo até ficar quase pretinha. Era uma atividade tão divertida como a de esperar a lagarta virar borboleta.

Observar a jabuticabinha crescer no pomar da escola tranquilizava minha ansiedade de nascença. Quando atingia o ponto, a gente corria até as árvores que me pareciam gigantes para colher os frutos ao alcance das mãos. A diversão continuava a cada frutinha colocada na boca.

Aprendi, naquele tempo, que o sabor da frutinha era uma mistura do suco de sua casca roxea com a polpa branquinha dentro. De tanto analisar, me especializei em saber quando um fruto não estava muito bom – ou já havia sido provado por um passarinho antes. Casquinhas um pouco abertas eram descartadas, mas sempre em um montinho de terra para ver se de lá surgiria outra jabuticabeirinha. Me fazia de passarinha, semeando jabuticabeiras que, para meu desalento, nunca brotavam.

À noite, deitava-me ao lado da minha mãe e irmã e brincava de olhos de jabuticaba, enconstando meu rosto ao dela. Ensinei meu filho a brincadeira, mas não consegui passar adiante meu amor pelas jabuticabinhas. Talvez só nos tenha faltado árvores e quintais.

3 comentários:

André disse...

Que texto gostoso!

Amuná Djapá disse...

Vc nao atualizava mais ele
e porque não confio em gente que não tem Facebook.

Stela Guimarães disse...

E eu não confio em ninguém com mais de 32 dentes. Salvem os banguelas.