domingo, abril 30, 2006

Acordando os mortos



A Carta
Por Mário Quintana

"Hoje encontrei dentro de um livro uma velha carta amarelecida,
Rasguei-a sem procurar ao menos saber de quem seria...
Eu tenho um medo
Horrível
A essas marés montantes do passado,
Com suas quilhas afundadas, com
Meus sucessivos cadáveres amarrados aos mastros e gáveas...
Ai de mim,
Ai de ti, ó velho mar profundo,
Eu venho sempre à tona de todos os naufrágios!
"


A Carta
Por Stela Guimarães

Aos 91 anos, ela colecionava cartas e pedaços de papel que eram a sua própria existência. Diferentemente da história usual, quando se colecionam cartas escritas pro outrem, ela guardava cuidadosamente as cartas escritas por ela própria e nunca entregues.

Eram cartas de amor, sempre direcionadas ao mesmo endereço, embora Ele nem vivesse mais lá ou neste mundo, à cartas de reclamação recentemente escritas à organismos de defesa ao consumdidor.

Sua vida estava lá, toda contada a pessoas que ela esperava encontra no Paraíso. Há muito tempo ficara sabendo que as cartas para o bem amado eram escritas em vão. Ele havia morrido em um trágico acidente envolvendo a escada de uma igreja e sua cadeira de rodas.

Mesmo sabendo da morte, ela continuava escrevendo incessantemente. Sentia-se assim em contato com aquele com quem vivera os melhores seis dias de sua vida, em um verão muito, muito distante dos dias idos.

E assim ela ia seguindo, escrevendo enquanto o ar entrasse em seus pulmões. E assim ele estaria lá, sempre.


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PS.: Justificativa brega e decadente: Porque toda Rose tem um Jack perdido em algum oceano por aí.
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Pergunta que quer calar:

Vale a pena acordar nossos mortos?
Ou continuar a nossa vida desviando
atenção a cada ocorrência de tal
pensamento?

That´s all, folks!

2 comentários:

Anônimo disse...

Nossa..Stela..lindo texto..porém triste.
E quem disse que coisas belas reside apenas nas coisas alegres, né?

Stela disse...

Pois é. São quase todos autobiográficos. Minha faceta de futurista a là Huxley... rs

Já apregoava Vinícius de Moraes:

"É melhor ser alegre que ser triste. Alegria é melhor coisa que existe. (...) Mas pra fazer um samba com beleza é preciso um boca de tristeza. Senão não se faz um samba não."

E o que seria do Blues sem o 'blue'?

Yes, I´m sad. ;-)